sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Camisa social, ou porque as pessoas sofrem tanto e fingem gostar

Polêmico título, não ?
Sim, acordei de mau humor hoje, provavelmente por ser o terceiro dia consecutivo chegando ao trabalho antes do Sol nascer. Então vou distribuir um pouco de veneno em quem (ou pelo menos alguns) que merecem. O tema de hoje é criticar o que eu considero um das maiores fontes de sofrimento humano dos últimos séculos. É algo que só causou menos problemas do que a religião e o marxismo: a camisa social.
Comecei tentando pesquisa a história da camisa social. Meu sucesso nisso foi, digamos, pífio. Consegui entender que o que hoje chamamos de camisa social é o resultado de uma evolução (sic) de produtos anteriores. Em tese, ela se tornou mais simples por deixarmos de lado os babados e flu-flus que podemos observar nos filmes históricos. O grande problema, então, é que o produto não evoluiu na velocidade ou direção corretas.
Usamos roupas por uma série de motivos. Alguns deles são reais e outros são auto-impostos. Os reais são, em essência, para atender a requisitos de conforto térmico e decoro. Os auto-impostos são para indicar posição social e expressar ideias. Estas  duas últimas por menos que alguns queiram admitir, não têm origem clara, são resultado de algum tipo de contrato social jamais escrito. Por um lado, eu sempre achei uma completa babaquice as pessoas precisarem se afirmarem quanto a sua posição social em algum cenário. Por outro, acho que ideias deveria ser expressas com palavras, já que nos demos ao trabalho de inventá-las. Qualquer outro método é, no mínimo, ineficaz.
Então vamos ao que realmente importa em uma roupa: proteger seu usuário das condições climáticas e esconder as partes íntimas que todos têm, todos sabem o que o outro têm, mas que por algum motivo estranho à minha compreensão decidimos que deve ficar oculto.
Acho que o leitor já entendeu meu ponto aqui. Não que eu seja nudista ou, pior, ativista do nudismo. Mas Desde a adolescência acho um enorme exagero o que se faz no sentido de se esconder nossos apetrechos biológicos. E não me venham com o argumento religioso-conservador-ultradireitista de que precisamos proteger nossas crianças: se todos andassem nus há 1000 gerações nada disso seria sequer debatido. Ainda assim, mesmo que cheguemos a conclusão triste de que o processo evolutivo humano deixou a necessidade de esconder nossos órgãos reprodutores como um defeito genético em nossos cromossomos de modo análogo ao daltonismo ou a anemia falciforme, a camisa nada se refere a isso por estar aplica a outra parte do corpo humano. Cai por terra, então, essa necessidade de decoro e principalmente sua relação com essa desgraçada invenção da mente humana.
Sobrou o conforto térmico como último bastião. E nisso, o leitor admitirá em alguns minutos, a camisa social falhou miseravelmente ao tentar obter.
As roupas são compostas por uma combinação de escolha de tecidos, formas cortas e montagem de modo a ficarem do jeito que são. Essas características são criadas em conjunto: não se pode alter apenas uma sem mudar dramaticamente o resultado final. Pensando nessa ideia, não se pode alterar o tecido usado sem que o todo mude totalmente, podendo-se até mesmo ficar socialmente ridículo. No entanto, várias partes de uma camisa social servem única e exclusivamente para irritar o usuário.
As camisas tem colarinhos, por exemplo. Os colarinhos incomodam, apenas, o tempo todo. Fica cutucando a nuca e o pescoço sem nenhuma razão aparente ou mesmo oculta. Não protegem do frio, no entanto: quando estamos no inverno, fechar o colarinho não aumenta nem a proteção nem a sensação de proteção, obrigando a pessoa a usar um casaco ou algo do gênero. No calor, é uma coisa a mais que aquece por impedir a circulação do ar e retendo desnecessariamente o calor do corpo. E ainda por cima sujam com assombrosa facilidade mesmo que o usuário permaneça estático dentro da roupa por horas.
O segundo item errado está nos punhos. Também não tem nenhuma utilidade prática. Para quem usa relógio de pulso, dificulta o acesso ao mesmo. Quando fechados, predem uma parte da roupa dificultando o movimento dos braços reduzindo a agilidade. Sujam com enorme facilidade e ainda podem enganchar em projetos soltos.
A abertura frontal com botões é algo totalmente anacrônico desde a invenção do ziper. Hoje em dia, pelo menos se prendem com firmeza, mas em um passado não muito distante, a falta de precisão na fabricação fazia com que eles fossem de dois tipos: os que não prendem e os que não soltam. Ainda assim, é comum descosturarem-se e caírem no meio do uso, causando desconforto social (obviamente autoimposto) ao usuário. Para piorar, algum imbecil achou por bem criar variedades de botões. Ou seja, se você perder um botão da sua camisa nem tente procurar um para substituir: você não vai achar.
O tecido usado nas camisas sociais é de uma burrice aguda assombrosa no século XX. Imagine no XXI então. Não protege do frio: qualquer ventinho que passa atravessa a camisa como se ela não estivesse lá. Não traz conforto no  calor: quando esquenta, promove pouquísima troca de calor com o ambiente se comparado com coisas mais tecnológicas. Mancha até com ar: qualquer coisa que esbarrar em uma camisa social deixará sua marca, até mesmo substâncias que saem com relativa facilidade de outros tecidos como refrigerantes ou molho branco. Amassa com o olhar: só de se tirar uma camisa se seu cabide elá já está amassada.
Eu até poderia entender o uso da camisa social se estivéssemos nos anos 1950. Mas com a invenção da camiseta nos anos 60 qualquer tentativa de defesa da camisa social provocará risos. Aplique cada um dos conceitos do parágrafo acima a uma camiseta e você, leitor, notará o quão covarde é a comparação. Se juntarmos a isso a ausência das partes supérfluas de uma camisa, alguém começará a perguntar "putz, onde erramos então ?"
O fato físico incontestável é que bilhões de pessoas no mundo todo poderiam, todos os dias, irem trabalhar com uma camiseta branca simples, honesta, com bom caimento, confortável e agradável ao toque, mas usam um produto totalmente ultrapassado sob qualquer tipo de análise, inclusive econômica.
Sofremos, pagamos caro por isso, e ainda somos socialmente obrigados a dizer que camisa social "é algo importante" ou "que dá boa aparência" ou "que é o certo".
Que grande mentira.

2 comentários:

  1. Lindo, não revolta!
    Tá, eu preparo uma aulinha sobre camisas pra vc, respira, conta até dez...

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  2. Os séculos de treinamento da sociedade ainda fazem praticamente toda a humanidade achar que homens de ternos são charmosos e bem sucedidos.

    O que me leva a um ponto meio que deixado de lado: nós não temos penas.

    Explico: Todo mundo quer ser diferente (estou escrevendo no exemplo prático disso) e no fundo todo mundo quer se sentir bonito. E ao contrário das aves (pavões me ocorrem) não temos penas multicoloridas em padrões diferenciados para chamarmos a atenção e nos diferenciar um dos outros.

    Então, as roupas servem também para nos diferenciar um dos outros, para chamar a atenção dos outros para nós. Em última análise, nos vestimos bem visando sermos despidos por alguém (pessoalmente eu não conheço uma mulher sequer que ache um homem de camiseta mais bonito do que o mesmo homem numa camisa social).

    Tente analisar pelo outro lado: praticamente todos os seus argumentos podem ser usados para tornar idiota o uso de vestidos, salto alto, lingerie sexy, maquiagem...

    De mais a mais, boa aprte das minhas camisas não apenas são mais confortáveis de usar no calor do que as minhas camisetas como também são feitas de um material bem mais resistente a amassados do que o material das minhas camisetas.

    A única exceção a isso é uma camiseta dry-fit que eu tenho, mas ela sozinha custou mais caro do que qualquer uma das minhas camisas, incluindo as feitas sob medida. :P

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